“E se a formação acadêmica não importasse mais?” Uma reflexão sobre educação e IA.
“Há 20 anos, eu teria colocado minha filha nas melhores escolas, mas agora não importa mais.”
Essa frase, dita por Benjamin Mann, engenheiro e cofundador da Anthropic (empresa criadora do modelo de IA Claude), em um podcast recente, me fez parar para pensar: qual é, hoje, o papel da escola em um mundo tão impactado pela inteligência artificial?
Vivemos um tempo em que a tecnologia avança mais rápido do que conseguimos absorver. O que era essencial ontem, hoje está em revisão. Ao escutar falas como a de Ben Mann, o convite não é reagir com julgamento imediato, mas buscar compreendê-las com olhar crítico e, sobretudo, com escuta pedagógica.
Este texto parte tanto da conversa original (podcast) quanto da reportagem que a repercutiu, e propõe uma análise sob o ponto de vista de quem vive a educação na prática. Não há aqui atalhos nem extremos. Há intenção. Porque quando lemos com cuidado, cruzamos fontes e aplicamos nossos filtros educacionais, o que parece provocação pode, na verdade, ser um chamado: vamos repensar a escola com mais intenção e mais sentido?
Ben Mann tem uma trajetória marcada por esforço e estudo. Sua crítica não vem de fora da educação, mas de alguém que a experimentou profundamente e que agora se pergunta se esse mesmo caminho ainda faz sentido para as próximas gerações. Em um cenário de mudanças tão rápidas, essa dúvida é legítima — e precisa ser discutida.
A seguir, compartilho quatro pontos dessa reflexão, com escuta ativa e espírito crítico, mas sem apontar culpados. Porque se queremos transformar a educação, precisamos começar por entender aquilo que ela tem deixado de oferecer.
1. A escola perdeu valor?
Quando Mann diz que não colocaria mais sua filha nas melhores escolas, ele não está negando a importância do aprendizado. O que está em questão é o valor do diploma como garantia de sucesso em um mundo moldado por IA.
O ponto central é este: a escola continua sendo essencial, mas precisa reencontrar seu propósito como território de formação integral, de investigação e de convivência, não como um espaço de respostas prontas.
A inteligência artificial amplia o acesso à informação, mas não substitui a mediação pedagógica, o pensamento crítico e o engajamento ativo na construção do saber.
2. Curiosidade e felicidade bastam?
Mann diz desejar que seus filhos sejam "felizes, curiosos, atenciosos e gentis". E quem não quer isso para uma criança?
Mas, como educadores, sabemos que curiosidade sem mediação pode se transformar em dispersão. Para que essa curiosidade se converta em aprendizado significativo, é preciso contexto, desafio, interação. Teorias como as de Vygotsky, Piaget e Zabala nos mostram que o desenvolvimento acontece na relação com o outro, com o ambiente e com o conhecimento — e que isso precisa estar articulado a uma pedagogia intencional e crítica.
Curiosidade é combustível. Mas é a educação que a transforma em potência criativa.
3. Saber perguntar é mais importante do que saber responder?
Sam Altman, CEO da OpenAI, afirmou: “Determinar quais perguntas fazer será mais importante do que saber a resposta.”
Concordo. Mas vale a pergunta: quem nunca construiu repertório, pergunta o quê?
Saber perguntar é uma habilidade complexa, que nasce da escuta, da experiência e da compreensão do mundo. Isso também se aprende. Não é talento inato — é prática pedagógica.
4. Habilidades técnicas estão obsoletas?
Se a IA já programa, traduz, desenha e escreve... o que sobra para nós?
Sobram os sentidos. Os contextos. Os dilemas. Os julgamentos. As conexões.
A IA executa. Mas é o humano que dá sentido.
A formação técnica muda, mas não desaparece. Continuamos precisando de pessoas capazes de interpretar, avaliar, decidir e dar direção ao que as máquinas produzem. E isso também se ensina, se pratica, se desenvolve.
Técnica e tecnologia são ferramentas. O que as torna relevantes é o olhar crítico e consciente de quem as utiliza.
O que está em jogo?
A fala de Ben Mann pode soar provocativa — e talvez seja. Mas escutá-la com atenção, aplicando o filtro da educação, nos ajuda a perceber que ela reflete algo maior: uma transformação de época. Não se trada de:
- abandonar a educação formal, mas de reinventá-la para cultivar curiosidade e pensamento complexo.
- substituir professores por IA, mas de formar sujeitos capazes de dialogar com a tecnologia com ética, criticidade e autoria.
- abrir mão do conhecimento, mas de resgatar a mediação humana como algo insubstituível.
O próprio podcast que originou essa discussão tratava de cultura organizacional e decisões em startups de tecnologia — não era sobre educação. Justamente por isso, foi preciso aplicar o filtro da pedagogia para captar os sinais sutis que já ecoam em sala de aula, na formação docente, nas políticas públicas.
Para educar neste novo tempo
Há sabedoria nas falas de quem passou por trajetórias exigentes. Quando escutamos com atenção e com o olhar da educação, conseguimos extrair lições poderosas para o presente — e inspirações transformadoras para o futuro.
Precisamos de escolas que cultivem pensamento crítico, autoria, colaboração, escuta e responsabilidade. Não para competir com a inteligência artificial, mas para ensinar a usar a tecnologia com intencionalidade e consciência.
Ben Mann construiu sua carreira com base em estudo e esforço. Hoje, lidera projetos que moldam o futuro tecnológico. Quando questiona a escola tradicional, não está negando a importância do aprendizado — está sinalizando que algo precisa mudar.
E talvez enxergue isso justamente porque trilhou esse caminho.
Sua fala nos convida a repensar o papel da escola, mas também a valorizá-la como um espaço vivo: de perguntas, relações, sentidos e formação humana.
Porque, mesmo em um mundo mediado por IA, ainda é o humano que pergunta, escuta, conecta e transforma. Quando aprende a pensar com profundidade, agir com empatia e construir com responsabilidade — ele continua sendo insubstituível.
Curiosa.Mente. Porque transformar a educação começa com uma pergunta: E se a gente escutasse antes de criticar?
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