Da Intuição à Estratégia: Como minha trajetória como Designer Instrucional se alinha, de forma orgânica, às tendências evidenciadas pelo case Duolingo
Da Intuição à Estratégia: Como minha trajetória como Designer Instrucional se alinha, de forma orgânica, às tendências evidenciadas pelo case Duolingo
Transformações profundas não costumam vir com manuais. Muitas vezes, elas nascem da prática, da escuta e da coragem de experimentar antes que os padrões estejam definidos.
Nos últimos anos, tenho me dedicado a construir uma atuação como Designer Instrucional (DI) que vai muito além da produção de conteúdo. Essa transição ganhou força durante a pandemia, quando me aproximei de comunidades colaborativas como o grupo Co11ectadas, onde a troca com outras mulheres da tecnologia ampliou meu repertório e fortaleceu minha visão sistêmica da educação digital.
A partir de novembro de 2022, com o advento dos modelos de IA generativa, percebi que não se tratava de uma moda passageira, mas de uma virada estrutural na forma como produzimos e mediamos a aprendizagem. Comecei a experimentar, testar e integrar essas ferramentas no meu cotidiano profissional desde o início, sempre com o cuidado de manter a curadoria humana no centro. Também ministrei oficinas por um pouco mais de um ano, para quem quisesse começar nesta jornada.
Em um mundo em que a educação digital se torna cada vez mais complexa, interconectada e mediada por tecnologia, percebi que era hora de expandir meu papel para algo mais estratégico, sistêmico e conectado às necessidades reais de aprendizagem e desempenho.
Essa percepção não veio de uma tendência ou de um movimento do mercado. Veio da prática. De viver os desafios diários de times sobrecarregados, fluxos descentralizados, conteúdos dispersos e processos pedagógicos desalinhados das necessidades reais de quem aprende. Veio da escuta de educadores, conteudistas, gestores e, claro, dos próprios alunos.
Na época, não imaginava que minhas escolhas estavam em sintonia com o que hoje é considerado um dos casos mais relevantes de transformação digital com IA na educação: o case Duolingo.
Duolingo e a Revolução da IA no Design Instrucional
Em um artigo recente, a pesquisadora Dra Philippa Hardman analisou como a Duolingo transformou completamente sua abordagem de design instrucional ao integrar inteligência artificial em todas as etapas do modelo ADDIE. A plataforma, conhecida mundialmente por seu ensino de idiomas, implementou IA para automatizar análise de dados, geração de conteúdo, personalização da experiência do usuário e avaliação contínua.
Principais Insights do Artigo:
Transformação do Modelo ADDIE com IA.
Escala e Velocidade Sem Precedentes.
Redefinição do Papel do Designer Instrucional.
Experiência de Aprendizagem Hiperpersonalizada.
Mudança de Mentalidade e Conjuntos de Habilidades.
Do papel clássico ao DI estratégico: a minha transição
Na minha atuação como gestora de projetos educacionais, percebi que repetir estruturas, replicar conteúdos e operar sob pressão de entregas não garantia aprendizagem significativa. Isso me levou a redesenhar minha prática com três frentes principais:
Sistemas de gestão pedagógica e acervo digital.
Fluxos de produção com integração de IA generativa.
Mapeamento e acompanhamento de processos com métricas de qualidade.
Entre março de 2023 e março de 2024, atuei na Elevagro com a aplicação prática da IA generativa em um projeto de reformulação de cursos, conduzindo a produção e validação de quase 3.000 objetos de aprendizagem com atenção à autoria, curadoria e clareza pedagógica. Essa experiência consolidou os fundamentos do que mais tarde se tornaria o framework IA4p.
Desde outubro de 2024, iniciei dois novos projetos simultâneos, na área da educação, com previsão de término em outubro de 2025. Em um deles, estamos integrando os times de aprendizagem e tecnologia da informação na estruturação de um sistema de gestão de produção integrada, que envolve projetos, tarefas, recursos e automações. Esse movimento tem sido fundamental para conectar as decisões pedagógicas às operacionais, com apoio da IA para tornar os processos mais inteligentes, rastreáveis e sustentáveis.
Nestes projetos, sigo aplicando os princípios do IA4p — tanto no apoio à tomada de decisões com base em dados, quanto na personalização da aprendizagem e na automação de fluxos, sempre com atenção à ética, responsabilidade e autoria. Essas experiências mais recentes têm representado oportunidades concretas para ampliar a maturidade do uso da IA na educacão, tanto nos bastidores quanto nos pontos de contato com estudantes, professores e gestores. Juntas, essas vivências sustentam a transição do papel tradicional do DI para um perfil mais sistêmico, estratégico e comprometido com a aprendizagem significativa.
Esses movimentos culminaram na criação do Modelo IA4p, um framework para uso estruturado de IA generativa com foco em propósito pedagógico. O modelo tem quatro pilares fundamentais:
Fundamentos de IA
Engenharia de Prompts
Diretrizes, Ética e Transparência
Potencialidade das Soluções de IA
Esse framework não pretende ser uma receita. É uma proposta de organização para quem quer trabalhar com IA sem abrir mão da qualidade, da autoria e da inteligência humana no centro do processo.
Onde estamos alinhados?
Lendo o artigo de Hardman sobre a Duolingo, algumas convergências ficaram evidentes:
Centralização de conteúdo com curadoria ativa.
Automatização de partes operacionais sem abrir mão da validação pedagógica.
Uso de IA como suporte ao DI, não como substituição.
Gestão baseada em dados com tomada de decisão responsiva.
Foi como se tivesse lido uma confirmação: sim, estamos no caminho certo.
O que ainda preciso melhorar
Integração de dados de aprendizagem em tempo real.
Especialização em Data Literacy educacional (é a habilidade de ler, interpretar e usar dados de forma crítica no contexto da educação, transformando-os em informações relevantes para apoiar decisões e fortalecer o processo de aprendizagem de estudantes e professores).
Automatização de fluxos de revisão e compliance.
Referências e Caminhos que Fundamentam minha Trajetória com IA na Educação
Ao longo dessa jornada de transformação como Designer Instrucional estratégico, diversos marcos e documentos serviram como norte e inspiração. Mais do que referências teóricas, essas fontes moldaram decisões práticas e ajudaram a consolidar princípios como ética, autoria, curadoria e intencionalidade no uso da inteligência artificial na educação.
Entre os documentos mais significativos que influenciaram meu processo estão:
UNESCO (2021) – Recomendação sobre a Ética da Inteligência Artificial. Um documento que reforça a urgência de uma IA centrada no ser humano, inclusiva e transparente, ajudando a estabelecer parâmetros para uso responsável na educação.
IEEE Standards (7000-2021 e Ethically Aligned Design) – Pautam metodologias para desenvolvimento ético de sistemas inteligentes, algo que dialoga diretamente com o que venho buscando com o Modelo IA4p: ética integrada desde a concepção.
OPENAI Usage Policies – Uma fonte essencial para compreender os limites de uso da IA generativa de forma legal, segura e transparente.
NATURE (2023) – ChatGPT is not an author. Uma reflexão editorial que reforça o valor da autoria humana na produção intelectual, algo que defendo ativamente no uso educacional da IA.
AI Index Report (Stanford, 2025) – Contribuiu para que eu compreendesse a velocidade e a complexidade dos avanços da IA no ecossistema educacional global — e o impacto crescente sobre políticas, práticas e perfis profissionais.
BOONSTRA et al. (Google Cloud, 2025) – Referência técnica fundamental no entendimento e aplicação de técnicas de prompt engineering, com implicações diretas na produção assistida por IA.
E claro, também trago como parte dessa trajetória as minhas próprias produções, como:
Escala VIMON – Um instrumento que desenvolvi para valorizar a autoria no uso de IA, e que evoluiu com base nas boas práticas e discussões sobre ética, clareza e coesão nos prompts educacionais.
Relato de Experiência: Construção de um Sistema de Prompts de IA – Compartilhado em 2024 no LinkedIn, mostra como foi possível estruturar fluxos com IA generativa mantendo o olhar pedagógico e colaborativo.
Além dessas referências, os princípios do Learning Experience Design (LXD) (LXD é o design intencional de experiências de aprendizagem que colocam o aprendiz no centro, com foco na empatia, relevância e transformação) têm sido meu guia metodológico. Planejamento centrado no aprendiz, empatia na personalização, metodologias ativas e o educador como coautor da experiência são pilares que dialogam diretamente com o tipo de inovação que acredito e pratico.
As estruturas da maioria de meus clientes baseiam-se na Taxonomia de Bloom para trabalhar o desenvolvimento de competências — uma abordagem que, conforme aponta a professora Paula Carolei, tende a reforçar um viés mais comportamental e hierarquizante do aprendizado, especialmente quando aplicada a contextos mediados por tecnologia. Inspirada por suas reflexões e por suas articulações com os referenciais de Zabala e Arnau, comecei a direcionar meu estudo em uma abordagem que compreende a competência como ação situada, complexa, e relacional — um entrelaçamento de saberes, fazeres e modos de ser que se manifesta na resolução de situações reais e significativas. Essa perspectiva rompe com o paradigma da instrução linear e valoriza a agência, a imersão e a transformação do sujeito no processo formativo, especialmente em experiências digitais e gamificadas. Essa virada teórica se alinha de forma importante com o pensamento nexialista, no qual acredito e que orienta minhas práticas: um modelo de aprendizagem que estimula a articulação entre áreas, a criticidade, a criatividade e a construção de soluções em contextos complexos — aspectos essenciais em projetos de formação mediados por Inteligência Artificial, nos quais não basta aplicar conteúdos, mas é necessário propor experiências formativas que ampliem consciência, autonomia e responsabilidade ética.
Essas bases me permitem atuar como ponte entre teoria e prática, articulando pensamento crítico, design estratégico e uso ético e responsável da tecnologia. É esse o compromisso que carrego ao integrar IA à educação: uma transformação com propósito, sustentada em referências sólidas e constantemente revisitada com escuta e responsabilidade.
Finalizando com um convite
Se você também acredita que a educação digital pode ser mais do que entrega de conteúdo, vamos conversar. Estou aberta a trocas, colaborações e parcerias com quem quiser construir experiências de aprendizagem com sentido, estrutura e responsabilidade.
Comecei essa jornada por intuição. Hoje, sigo com estratégia. E sigo com propósito. Porque educar, com ou sem IA, é sempre sobre criar caminhos para que o outro aprenda a caminhar por si.
Afinal, como bem disse Dra. Philippa Hardman, não estamos presenciando a morte do design instrucional. Estamos entrando "na era dos especialistas". Ou seriam, dos nexialistas?
Referências
AI INDEX. 2025 AI Index Report. Stanford University: Stanford Institute for Human-Centered Artificial Intelligence, 2025.
BOONSTRA, Lee et al. Prompt Engineering. Google Cloud, fevereiro de 2025.
IEEE. Ethically Aligned Design*: A Vision for Prioritizing Human Well-being with Autonomous and Intelligent Systems*. IEEE Global Initiative on Ethics of Autonomous and Intelligent Systems, 2019.
IEEE. Standard 7000-2021: Model Process for Addressing Ethical Concerns During System Design. IEEE Standards Association, 2021.
MENDES, Mônica Campos Santos; MONTEAVARO, Viviane; CAROLEI, Paula. Inteligência Artificial como Apoio ao Design de Colaboração. In: ANAIS DO 28° CONGRESSO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 2023, 2023, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos..., Galoá, 2023. Disponível em: https://proceedings.science/ciaed-2023/trabalhos/inteligencia-artificial-como-apoio-ao-design-de-colaboracao?lang=pt-br Acesso em: 27 Maio. 2025.
MONTEAVARO, Viviane. Como criar prompts eficientes e valorizar a autoria com a Escala VIMON. LinkedIn, 2024.
MONTEAVARO, Viviane. Relato de Experiência: Construção de um Sistema de Prompts de IA para Produção de Material Educacional. LinkedIn, 2024.
MONTEAVARO, Viviane; CAROLEI, Paula; MENDES, Mônica Campos Santos. Inteligência Artificial e EAD: modelos e controvérsias. In: ANAIS DO 28° CONGRESSO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 2023, 2023, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos..., Galoá, 2023. Disponível em: https://proceedings.science/ciaed-2023/trabalhos/inteligencia-artificial-e-ead-modelos-e-controversias?lang=pt-br Acesso em: 27 Maio. 2025.
NATURE. Tools such as ChatGPT threaten transparent science; here are our ground rules for their use. Nature, editorial, 2023.
OPENAI. Usage Policies. OpenAI, 2023.
UNESCO. Recommendation on the Ethics of Artificial Intelligence. Paris: Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2021.
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